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Legislação e formação de peritos avançam no combate a fraudes financeiras

Os especialistas também destacam o papel crescente da tecnologia, especialmente a digitalização dos processos judiciais, na evolução da perícia contábil

Braços de pessoa com terno mexendo em notebook com sinalizações de segurança

O Brasil tem dado passos importantes no combate às fraudes financeiras, impulsionado por uma legislação cada vez mais completa e pela formação de profissionais mais capacitados. O tema tem ganhado relevância, especialmente diante de grandes escândalos de corrupção e fraude que abalaram o País, como o caso das Lojas Americanas. Quem explica sobre o tema é o professor Edgard Cornacchione, coordenador do grupo de investigações periciais forenses e tecnológicas (Perfor), vinculado à Faculdade de Economia, Administração Contabilidade e Atuária (FEA), e o perito contador Marcelo Gomes, mestre e doutor em Contabilidade pela FEA, perito contador investigador de fraudes e pesquisador do grupo.

Edgard Cornaccione – Foto: FEA – USP

O surgimento do Perfor

Cornacchione explica o papel do grupo e a necessidade de unir pesquisa acadêmica com a prática da perícia contábil: “Ele nasceu em função de uma desconexão entre a pesquisa acadêmica nesse segmento de perícia contábil, detecção de fraude, investigações, tanto na esfera civil como na esfera criminal, e o volume de operações, o volume da prática pericial, da prática de investigação ligada a esses temas no Brasil”.

A situação no Brasil, segundo o professor, é marcada por um ambiente de alta litigiosidade e complexidade: “No Brasil nós temos aproximadamente um 1,5 milhão de advogados, um pouco mais de meio milhão de contadores, 81 milhões de processos correndo na justiça e nós estamos falando de 21 milhões de empresas no País. O ambiente é propício para litígios, para disputas, para problemas”. Para enfrentar esses desafios, o grupo reúne especialistas e pesquisadores de diversas áreas, visando a fortalecer as investigações e a melhorar o entendimento sobre o combate a fraudes.

A evolução da legislação 

Marcelo Gomes abordou a evolução da legislação brasileira no combate à corrupção e fraudes financeiras. Para ele, o avanço das leis no Brasil foi notável, mas ainda há muito a ser feito para capacitar os profissionais e aprimorar os sistemas de prevenção. “Quando a gente começou a pesquisa, lá em 1995, não tinha lei de prevenção à lavagem de dinheiro, não tinha lei anticorrupção, não tinham casos notáveis de corrupção ou de fraude conhecidos na mídia […] Você traz dois pontos interessantes, que é, de um lado, a legislação vem avançando, de outro, a gente precisa melhorar, aperfeiçoar a formação destes profissionais.”

A formação de peritos contábeis

Os pesquisadores destacam a importância da formação dos contadores peritos, ressaltando que a detecção e a prevenção de fraudes dependem de profissionais bem treinados, com forte base ética e conhecimento técnico. Gomes ressalta que, além do domínio da contabilidade, os peritos precisam saber identificar sinais de fraudes e conhecer bem os canais para denúncia. “A educação dos contadores é primordial neste momento, para que eles conheçam as questões de ética que estão envolvidas, conheçam como identificar e prevenir a fraude, quais são os canais de comunicação que eles podem usar para fazer as denúncias de fraude.”

A necessidade de treinamento constante foi outro ponto abordado pelos especialistas. Gomes aponta que o cenário atual exige dos profissionais uma atualização permanente, seja em contabilidade, ética ou tecnologias emergentes: “A profissão exige atualização constante. O Conselho Federal de Contabilidade exige, por exemplo, 40 horas anuais de desenvolvimento profissional para que os contadores mantenham suas credenciais. O mercado está em expansão e os profissionais têm a oportunidade de atuar em áreas como auditoria, órgãos públicos e até mesmo na Polícia Federal, que oferece treinamentos especializados”.

O impacto da tecnologia 

Cornacchione também destacou o papel crescente da tecnologia, especialmente a digitalização dos processos judiciais, na evolução da perícia contábil. Segundo ele, a digitalização, que começou há mais de dez anos, agora é uma realidade em todas as esferas judiciais e extrajudiciais: “O nosso Judiciário passou por um processo de digitalização. A tecnologia, que é um elemento central do Perfor, se faz presente na atividade pericial. Boa parte dos elementos probatórios, dos documentos que são analisados, das evidências que são tratadas, estão em meio digital”.

O uso de tecnologia, como a inteligência artificial, tem transformado a maneira como os peritos lidam com grandes volumes de dados. Cornacchione enfatiza que a análise de documentos e evidências digitais sem o uso de ferramentas tecnológicas seria ineficaz, o que torna o domínio dessas ferramentas essencial para a atuação do perito: “Os processos podem chegar facilmente a milhares, dezenas de milhares de páginas. E a avaliação desse volume de dados, de evidências, sem o componente tecnológico, se faz menos eficiente”, conclui.